(*) Carlos Brickmann –
Dois ministros dormindo num dia, um ministro dormindo no outro,
sabe-se quantos telespectadores dormindo a cada reunião do Supremo no
julgamento do Mensalão. É um caso importantíssimo; e chatíssimo. Pior, é
chato sem necessidade. Todos já sabem que os meritíssimos têm méritos,
os doutores são doutos, as excelências são excelentes. Por que ocultar o
pensamento sob tantas palavras?
Imaginemos que as mil e poucas páginas do relatório fossem divididas:
uma parte, curta, traria opinião e decisão do ministro; outra, com
citações, antecedentes, justificativas, se transformaria em links da
Internet. Quem quiser lê-las as terá à disposição, sem consumir duas ou
três tardes ouvindo a leitura de tudo – e, melhor, podendo retornar a
algum trecho, se quiser. Caso alguém prefira ouvir, o link trará uma
opção de som, com um locutor profissional e especializado.
Estranho? Nem tanto: antigamente, os processos eram escritos a mão em
papiro ou pergaminho; passaram a ser impressos, sem que nada se
perdesse. Hoje é desnecessário, como era feito há pouco tempo, costurar
os processos com barbante. Por que não usar os meios eletrônicos para
facilitar o trabalho dos ministros e advogados, para que o público
entenda melhor o que está acontecendo?
Este colunista, dizem pessoas abalizadas (especialmente parentes e
amigos), não é burro. E não tem a menor condição de acompanhar e
entender a posição do juiz expressa em mil páginas. O palavrório
desperta o sono, não a inteligência. Que o processo judicial acompanhe
os tempos. Mil páginas, nem Shakespeare.
O limite da atenção
Contam as velhas lendas que o rei Xeriar, da Pérsia, enlouqueceu ao
ser traído pela esposa. Casou-se então com uma virgem, e após a noite de
núpcias mandou matá-la. Casou-se com outra virgem, e após a noite de
núpcias mandou matá-la (e assim morreram muitas e muitas mulheres). A
folhas tantas, casou-se com Scheherazade, que pediu ao rei para
contar-lhe uma história. O rei concordou; e Scheherazade contou-lhe uma
história, parando num trecho especialmente interessante. O rei, curioso
em saber a continuação, não a matou. Durante mil e uma noites, a moça
foi-lhe contando os capítulos de sua história. Quando terminou, já tinha
três filhos do rei; e ele desistiu de matá-la.
Imagine o que teria acontecido a Scheherazade se, em vez de contar a
história em capítulos, tivesse na noite de núpcias sacado um robusto
volume de mais de mil páginas. O rei nem consumaria o casamento: iria
direto para a execução.
O início da campanha
Esqueça as pesquisas, os chutes, a torcida: a campanha eleitoral
começou agora, com o horário gratuito. O caro leitor pode achar que é
chato, pode assistir aos programas da TV a cabo, pode ir para o
computador. A maioria do eleitorado vê e ouve o horário gratuito, nas
cidades em que é disponível, e o usa para escolher seu candidato. Isso
não vale para vereadores, que mal têm tempo para dizer seu nome prometer
que vão lutar pelo povo. Mas, para candidatos a prefeito, é vital.
Erundina conta tudo
A deputada socialista Luiza Erundina (que apoia o petista Fernando
Haddad para a Prefeitura de São Paulo) resolveu contar tudo sobre as
alianças de Haddad e da presidente Dilma Rousseff. Narra como Haddad
comprou o apoio de Paulo Maluf para ganhar mais tempo na TV – o que a
levou a desistir de ser sua vice. “Houve barganha. O Maluf exigiu a
Secretaria da Habitação, que tem obras, no Governo do Geraldo Alckmin,
em troca do apoio ao José Serra”, conta Erundina. “Como o Alckmin se
negou a dar a Secretaria, Maluf veio para o Haddad. A presidenta Dilma
deu para o Maluf uma secretaria nacional com mais recursos
orçamentários. Foi pago para que o Maluf se coligasse com o PT”.
Aqui não fico
A narrativa de Erundina vem dois meses depois de ter renunciado a ser
vice na chapa do petista Haddad. Explica que a aliança firmada entre
Haddad, Maluf e o ex-presidente Lula – que confraternizaram na mansão de
Maluf – foi um golpe que a deixou decepcionada e a fez desistir da
disputa.
A seu ver, a aliança mostrou o quanto a política brasileira teve seu nível rebaixado.
Fogo alto
O julgamento do Mensalão ofusca outros acontecimentos; mas as coisas
continuam rolando e, mais cedo ou mais tarde, vão acabar virando
manchete. A mais importante é a CPI do Cachoeira: de acordo com a
procuradora Lea Batista de Oliveira, o grupo de Cachoeira não foi
desarticulado com sua prisão, e continua capaz de ameaçar quem o
investiga (ela, por exemplo, conta que recebeu dois e-mails com ameaças e
que uma mulher não identificada tentou entrar no prédio em que mora às
5h45 da manhã, sem êxito). “É uma organização criminosa armada,
sofisticada, complexa e ousada com código de silêncio orquestrado”,
afirmou. Acredita que é por esse motivo que os acusados nada respondem
na CPI.
Fogo baixo
Mas a empreiteira Delta tende a ficar fora das investigações. Pelo
que se comenta, a Delta tem ligações com partidos demais, ajudou gente
demais, sabe demais. Quando um caso tem muitas ramificações, costuma-se
deixá-lo de lado.
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